BLOG NOVO: CONTOS DO ICAL


quarta-feira, 23 de maio de 2012

Três retratos e uma foto - Suzana da Cunha Lima





3 RETRATOS E UMA FOTO


Olhar aquelas marcas na parede acordaram minha memória e invadiram meu coração de tristeza e saudade.  Ali morava sr.Nicola, um velhinho inda rijo, com uma farta cabeleira quase toda branca e  uns olhos azuis penetrantes que pareciam conhecer todos os segredos do mundo.
Último dos imigrantes italianos que ainda tinham ficado na fazenda, tudo  que era de madeira na casa tinha sido feito por ele próprio, com suas próprias mãos, como costumava se gabar. Lembro-me como a casa era cheirosa e bonita, com cortinas de renda e vasinhos de violeta nas janelas. Na frente, um jardinzinho bem cuidado, sempre florido e uma trepadeira enroscada na cancela de madeira. O aroma do jasmim, na florada, perfumava todo o ambiente, conseguindo até superar o cheiro acre do pito de sr.Nicola.

Só restara o rumorejar do pequeno córrego, saltitando fagueiro pelas pedrinhas miúdas, ali perto. Era difícil de acreditar que aquelas quase ruínas tivessem sido, um dia, palco de tantas vivências
extraordinárias e, principalmente, pertencesse, de maneira tão profunda  a meu passado infantil, marcando-o para sempre..

Nas férias escolares, eu e meus primos costumávamos ir naquela casinha muitas vezes, ao cair da tarde, para escutar as histórias de sr.Nicola,  enquanto ele se balançava numa velha cadeira de balanço, fumando seu pito. Sentávamos excitados e ansiosos em banquinhos de madeira ali no alpendre, loucos para  ouvir o próximo capítulo de uma espécie de novela que ele prolongava, com maestria, por todas as férias, enquanto  siá Tonha, sua mulher, nos servia bolinhos de chuva e café adoçado com rapadura: café com gosto de pecado, porque criança, naquele tempo, não tomava café.

Muita coisa aprendemos ali, com sr.Nicola, sentadinhos no alpendre, hipnotizados por suas conversas.  Ele, às vezes interrompia a narração para mostrar um galo atrás da galinha,  um bichinho perseguindo outro, os sinais da natureza apontando a chegada da chuva, vento ou frio, e assim, dentro de sua simplicidade, fomos aprendendo os mistérios do sexo e da vida.

Eles sabia como entreter e manter interessada sua pequena platéia. Ia contando cada dia uma espécie de capítulo, mas sempre incompleto, nos deixando em suspense, ansiosos para saber como aquilo tudo ia acabar. Para mim, foi o precursor dos grandes noveleiros de hoje. Pois, no ano seguinte, ele fazia um remake daquela história, acrescentava alguns detalhes, mudava os nomes, dava uma nova roupagem. E a gente adorava aquela epopéia, pois ele não nos poupava dos detalhes sórdidos: havia bandidos desalmados, crianças abandonadas, traições conjugais, prostitutas ardilosas, bebedeiras, abandonos, sofrimento.

A história central era uma saga familiar e se reportava aos quadros pendurados em sua sala. Contava de um casal recém-casado que tinha vindo de uma terra muito distante para tentar a vida naquelas
paragens.  Tinham algum dinheiro e arrumaram aquela casinha com muito capricho. Ele era muito habilidoso, logo arranjou um serviço de marceneiro na cidadezinha próxima.  Ela era uma excelente doceira e foi logo muito requisitada para as festinhas locais. E, orgulhosos e apaixonados, colocaram seu retrato de casamento na parede. Tudo andava bem entre eles, até que vieram as crianças, e foram muitas.  Ela não tinha mais tempo para fazer os doces, ele ficava muito tempo na cidadezinha e quase não vinha à casa, mas arrotava riqueza quando bebia no bar.  A mulher se queixava da falta de dinheiro e de atenção do marido e ele não queria saber de nada, já tinha se enrabichado com uma mulher do local.   Quando falta dinheiro, diz o ditado, todos gritam e ninguém tem razão.

Um dia, apareceram dois ladrões atrás do dinheiro que o marido se gabava ter.  Quatro dos filhos brincavam à frente, dois estavam no córrego pegando água.  Foram testemunhas do massacre da família, por bandoleiros bêbados, que não acreditaram que não havia dinheiro escondido por lá.   Quando a notícia se espalhou no lugarejo, o pai ficou alucinado. Levou os filhos restantes para os avós cuidarem e foi no encalço dos bandidos.  Isso durou muito tempo, mas um dia ele os encontrou.  Bebendo num bar, já velhos, sempre arrogantes e canalhas. Passou fogo neles e tomou rumo desconhecido, para não ser pego pela polícia.

Os avós resolveram morar na casinha com os netos e tentaram ganhar a vida plantando uma roça pequena no quintal. Um  dia, eles todos estavam na feira vendendo os produtos de sua roça, quando o pároco pediu ao lambe-lambe local para  tirar uma foto  dos velhos e outro das crianças. Quem sabe o pai voltaria um dia e poderia reconhecer seus filhos pelas fotos? Eles penduraram estas fotos na parede da sala.

Mas os avós  foram ficando velhos e doentes, não podiam mais trabalhar na roça nem cuidar das crianças. Saíram da casinha e foram viver no lugarejo, num quartinho minúsculo cedido pelo pároco. As crianças ficaram aos cuidados das beatas do local. Os velhinhos não duraram muito, morreram. O pároco encaminhou as crianças para serem cuidadas por famílias de outros lugares mais ricos. E assim aconteceu. Ninguém mais soube deles.

 O tempo se passou, a casinha ficou sem habitantes um bom tempo. Ninguém queria saber de morar lá, era enfeitiçada, tinha havido assassinato, mortes, traição, só desgraças.

Mas um dia, vindo de terras distantes,  lá se instalou outro casal, com  duas filhas, muito diferentes um da outra.  Uma é adotada, diziam à boca pequena.  Tinham vindo de um belo sítio, uma terras de montanhas e  cachoeiras. Colocaram a foto deste  lugar na sala, junto com os dos outros.   Ninguém tirava os retratos da parede, embora as famílias não fossem as mesmas. Não tinham outros para colocar no lugar e eles, afinal, enfeitavam a sala.

Neste ponto,  seu Nicola fazia o maior suspense, - Uma tarde Apareceu por lá um guapo rapaz. Um príncipe louro montado num belo cavalo. Nós ríamos muito quando ele falava desta maneira...Não tem mais príncipe aqui no Brasil,   seu Nicolas. Ele não ligava, seus olhos brilhavam e continuava:
-  Estava cansado e sedento, vinha de muito longe. Na roça, todos se ajudam, aí a senhora deixou ele entrar na sala, deu-lhe água e foi passar um café.  Enquanto esperava, ele ficou curioso com aqueles quadros pendurados na parede e foi examinar de perto as fotos.

-  Quem são estas crianças? Perguntou.
Ela disse que não sabia, os retratos estavam ali quando lá chegara, enfeitava, deixaram lá, apenas colocaram a foto do lugar de onde tinham vindo. É bonito, não?
Ele olhou mais atentamente e seu coração quase parou.
- É sim, mas estou interessado nestas outras fotos, eu conheço estas crianças e estes velhos.- parou, quase sem voz, já chorando de emoção.
-   Sou eu e minha irmã neste quadro e no outro,  meus avós.
A dona da casa mandou ele sentar, deu-lhe a água e ouviu o resto da história:
 – Meus pais e outros irmãos foram assassinados covardemente, só sobrou nós dois. Fomos morar com nossos avós e depois que eles morreram, nos separaram, cada um foi viver com famílias diferentes e nunca mais soubemos um do outro. -  disse ele. Nestas alturas, naquela casa,  todos estavam chorando – dizia sr.Nicola nos observando, porque também nós estávamos segurando as
lágrimas. E aí ele continuava a fala do irmão:
- Agora eu pude voltar, sou maior de idade, vim à busca de minha irmã.
 Sabe onde anda esta criança agora? Já deve estar moça feita.

Foi um corre corre na cidade. Estupefação geral. Por onde andaria a menina do retrato? Foram à Igreja perguntar ao vigário, que era daquele tempo e estava bem velhinho.  Ele olhou nos seus cadernos e logo lhe veio à mente aquela história triste: A chacina que acabara com quase toda a família  que morava na casinha do riacho,  duas crianças sobreviventes e assustadas e dois avós  que não duraram muito. Dois órfãos para encaminhar!! Como não lembrar?

 -A menina foi adotada pela família Silveira, que morava em Brotas do Sul, naquela ocasião.  Eu não queria separar as crianças, mas esta família só queria a menina, então  o irmão ficou com  siá Antonia e depois sumiu, fugiu, não se sabe para onde.

E aí, foi a maior surpresa! A família Silveira era justamente aquela que morava na casinha agora. Há alguns anos haviam passado por aquele lugarejo e a pedido do pároco resolveram levar a menina para fazer companhia à filha que já tinham, já que a mãe não podia ter mais filhos.   Esta menina era a irmã dele, imaginem... E estava ali mesmo, naquela casa, moça feita! Foi difícil  explicar a alegria deste reencontro. Os irmãos se abraçaram chorando (nisso sr.Nicola era muito bom na narrativa e a
gente acabava chorando também)

Depois daquela emoção, o rapaz acabou contando sua grande aventura: fugira de siá Antonia, com raiva e desespero, por se separar de sua irmã e acabara num convento de frades, que o acolhera.  Mais tarde fora enviado para a cidade grande para estudar, visto se tratar de menino muito inteligente, mas sempre tinha o propósito de voltar e procurar a irmã.  Não queria ser padre.  Fugira outra vez, vivera muitas aventuras, e, depois de ganhar dinheiro com bons empregos, voltara atrás dela.

- Agora, dizia, vou ficar por aqui, é a minha terra e de minha irmã. Sou bom marceneiro, sempre ganhei bem e quero casar e  ter minha própria família.

Acabou casando com a filha dos Silveira.  Trabalhador, ganhou muito dinheiro, deu todo conforto à sua família.  Mas não conseguiu curar sua irmã da tuberculose que se alastrava naquele tempo.  Ela morreu ainda moça, para seu desespero. Mais uma perda!

Se sr.Nicola reparava que a gente ficava muito triste com tanta desgraça, ele arranjava um jeito de contar um final feliz. Ora inventava que havia achado uma cura para a irmã, ora o rapaz tinha
ganho dinheiro na loteria e fizera muitos melhoramentos na cidade e assim por diante.  Esta história teve muitos finais, de acordo com o IBOPE que estava dando na audiência.

Só muito tempo depois é que fui saber quanto desta história tinha de verdadeira. Aquele irmão que viera em busca da irmã, um dos sobreviventes do massacre, era o próprio sr.Nicola. Criado pelos avós, depois pelos frades e depois pela vida, esta grande mestra.

sábado, 12 de maio de 2012

Meu primeiro e último amor - Dinah Ribeiro Amorim



MEU PRIMEIRO E ÚLTIMO AMOR!

(trabalhando com Antíteses: oficina)

Dinah Ribeiro de Amorim



A sala toda quieta, a casa dorme!

Eu, sentada no sofá, sem sono embora tarde da noite, penso no baile anterior.

Que sensação estranha... Que calor por dentro... Conhecera alguém que me fizera mudar!

Levanto e abro a janela. Faz frio na madrugada lá fora.

Poder estranho exerceu esse homem sobre mim. Fico alerta, desperta, com vontade de andar e ficar parada, temerosa de perdê-lo e ansiosa por vê-lo.

Feliz por dentro e, ao mesmo tempo, triste, na incerteza dos seus sentimentos.

Passo horas pensando em tudo que aconteceu. Nossa música, nossos passos de dança, nossas conversas longas, estendidas pelo baile todo.

Será que haverá um retorno ou mais uma aventura acontecendo na alegria do momento, deixando tristeza e esquecimento.

Acontecem tantos casos por aí! Tanta moça apaixonada, feliz e entusiasmada numa noite para desespero e decepção no dia seguinte.

Amor! Atração! Desejo! Sentimentos estranhos do ser humano. Todos eles me invadem e se misturam, unidos, como ondas revoltas que se quebram e se acalmam na solidão das praias.

Sinto tudo isso por ele ao mesmo tempo, colocando nesse início o meu final de linha.

Olho através da janela. Amanhece...

Um dia pela frente na esperança de um toque, um sinal, um chamado. Agüentaria isso ou tomaria iniciativa nessa ansiedade da espera.

Avisto uma sombra na calçada, um passante solitário. Alguém que, como eu, também não conseguiu dormir. Observo melhor e o reconheço.

É ele, o meu amor, o meu primeiro e último amor, sem sono, rodeando a minha casa. Apaixonado por mim!

MÊS DE MAIO! - Dinah Ribeiro Amorim


MÊS DE MAIO!


Dinah Ribeiro de Amorim



I

Maio lembra Mãe amada,

Por muitos considerada

Alicerce da nação.

É junto ao seio materno,

O aconchego fraterno,

Em caloroso afeto,

Saboroso alimento

Que floresce o rebento

Antes do primeiro pão.



II

É mês também de Maria,

A quem devemos amor

Por ter sido escolhida

Pra ser a mãe do Senhor!

Ela merece o feito

De ter gerado no ventre

Um ser, o mais perfeito,

Pra formação do crente.

Através de grande dor,

Libertou-nos do pecado.

Foi do mundo,Salvador,

Afastando o diabo.


III
Maio é o mês das noivas.

Só sonham felicidade;

Esquecendo-se das coisas

Que livram da crueldade.

Lar bom, marido perfeito,

Filhos bonitos e fortes

Podem ser meras quimeras

Quando só contam com sorte.

IV
Enfim, foi no mês de maio

Que raiou a Liberdade,

Tirando do cativeiro

Milhares de brasileiros!

sexta-feira, 11 de maio de 2012

Um contentamento descontente - Carmen Lucia Raso



Um contentamento cescontente
Carmen Lucia Raso

Ana subiu correndo a escadaria do prédio suntuoso, atravessou o grande portão de ferro trabalhado, correu pelo corredor que levava à sua sala.

Acenava e cumprimentava os funcionários e colegas que há tanto tempo conhecia.

Parou diante da porta, respirou profundamente e esperou que o professor lhe permitisse a entrada. Sorriu “aberta e timidamente” e  a “ passos largos caminhou devagar” até seu lugar.

Era o último ano da Faculdade de Medicina. Havia recebido a notícia que ganhara a Bolsa para cursar na Alemanha a especialização em neuro-cirurgia.

Sua alegria irradiava tanta luz que não notava seu “solitário andar por entre a gente”, mas todos percebiam algo diferente.

Os demais alunos voltaram a concentrar-se na análise microscópica de células humanas que faziam. O laboratório “cheirava a éter e humano, vivo e morto”.

Sentou-se mais perto de seus colegas para enfim descobrir que neste momento o resultado da análise microscópica  não era o mais importante e sim que estava “presa por vontade” em sua Bolsa de Estudos.

Sentia um “contentamento descontente” de estar ali, em sala de aula, sabendo que tinha tantas coisas a fazer.

domingo, 6 de maio de 2012

VIDA DE “SUPER-HERÓI - Dinah Ribeiro Amorim




VIDA DE “SUPER-HERÓI”!
Dinah Ribeiro de Amorim

  Rui, como tantos jovens, gostava de filmes de heróis, salvando mocinhas inocentes de bandidos, livrando cidades de monstros malignos ou extra-terrestres que pretendiam dominar a Terra.

  Não perdia nenhum filme de super-heróis, gostando também de  livros e revistas desses seres imaginários.

  Ficava tudo na sua mente de adolescente desengonçado, desajeitado, não prestando para trabalho nem esporte, mal conseguindo freqüentar a escola.

  Servia muitas vezes de chacota e piadinhas dos colegas porque derrubava as coisas, dava trombadas em postes, caía em buracos, não reparava em nada.

  Num final de semana, foi convidado por uma colega, Soninha, a um baile à fantasia. Era uma das poucas pessoas que acreditava nele e o compreendia. Aceitava-o como era.

  Rui, todo feliz, fantasiou-se de Batman, com máscara e tudo, achando que não seria reconhecido.

  Incorporou de tal maneira o personagem que até sua personalidade mudou. Entrou na festa todo aprumado, elegante, confiante na presença dos colegas, que não o reconheceram.

  Em certa altura da noite, após dançarem, beberem  e comerem, resolveram fazer uma brincadeira: cada um teria que realizar alguma proeza ou imitação do personagem que vestia.

  Rui ficou preocupado. E agora como seria sua atitude ao encarar essa farsa! Batman realmente era um grande herói e ajudado por Robin, ganhava todas as batalhas.

  Quando chegou sua vez, resolveu pular a janela como se fosse correr atrás de alguém que estivesse assaltando a casa.

  Tomou grande impulso, fez pose, saiu correndo sacudindo a capa, como se fosse voar.

  Deu um grande salto, escorregou no tapete, batendo fortemente a cabeça no vidro da janela, que quebrou, espalhando cacos pela sala e jardim.

  Todos riram muito e, sua colega Soninha, preocupada, correu a acudi-lo, ajudando-o a ficar em pé.

  Levaram-no ao quarto para descansar e fazer curativo na cabeça machucada. O rapaz mal se agüentava, de vergonha.

  Quando subiram, Soninha percebeu algo estranho: luz acesa no dormitório de sua mãe e as janelas abertas.

  Foram todos espiar e viram um homem maltrapilho, mexendo nas gavetas, roubando jóias, tudo de valor que encontrava. Colocava dentro de um saco.

  Quando os viu, ficou assustado e correu para a janela que um dos meninos já havia fechado, enquanto outro se dirigia ao telefone, chamando a polícia.

  O ladrão foi preso, os pertences devolvidos e, Rui, olhado com simpatia, como o herói da noite pois, graças às suas trapalhadas, um assalto à casa havia sido evitado.

  Batman agira realmente nele, foi o que pensou...

UM DESEJO DE SER HERÓ! - Dinah Ribeiro Amorim





UM DESEJO DE SER HERÓI!

 Dinah Ribeiro de Amorim


  Rui era um menino pacato, insignificante, morador do interior do estado de São Paulo, Ibitira, distante da capital. Vida simples, modesta, sem grandes pretensões, aparentemente.

  Freqüentava o único grupo escolar local, como outras crianças do seu tempo.
  Mas, era diferente! No íntimo, tinha um sonho de grandeza. Queria realizar atos úteis, de repercussão mundial, viajar, sair da cidadezinha, conhecer muitas pessoas, tornar-se famoso...

  Olhava todas as noites para o céu estrelado, para a Lua, imaginando coisas. De dia, o Sol, ao nascer e entardecer, reaparecendo entre nuvens, despertava sua curiosidade e entusiasmo. Deveria existir mesmo “vida” em outras galáxias.

  Talvez conseguisse fazer contatos que trouxessem benefícios aos habitantes da Terra. Desejava ser “super-herói”, um ser especial.

  Tanto imaginou e sonhou que passou a viver como se estivesse sendo observado por outros seres, querendo mostrar como vivia um terrestre.

  Mudou tanto o seu comportamento que deixou de ser real. Não vivia como os outros. Andava desligado, observando e meditando. Lia somente revistas e artigos sobre Astronomia, Astrologia, Ufologia.

  Quando ficou adulto, suas únicas amizades eram ufólogos ou pessoas que afirmavam contatos com extra terrestres.

  Seus pais se questionavam o por que dessa inclinação e a única resposta que encontravam era a morte de um irmão querido que o chamara muito antes de morrer e ele não conseguira fazer nada. Teve uma depressão após isso, nascendo, então, um desejo íntimo de busca, descobrir coisas poderosas como a cura de pessoas.
  O filme ET de Spielberger, chegou a Ibitira e Rui foi o primeiro da fila. Permaneceu boquiaberto, entusiasmado, acreditando piamente que era verdade.
  Passados alguns anos, após estudar e observar muito o Universo, numa madrugada, sentiu um sinal estranho em suas mãos. Não via nada, ninguém, mas uma quentura gostosa, um formigamento, passava pelo seu corpo e terminava nas mãos.

  Foi até o quintal e colocou suas mãos sobre uma planta seca, ressequida, paixão de sua mãe. Como no filme, imediatamente a planta renasceu, tornando-se viva, brilhante, abrindo-se toda para ele.

  Assustado e encantado, recuou alguns passos. Pedira tanto a Deus, ao Universo, aos extra-terrestres que acreditava, o dom de cura, o poder de aliviar doenças e dores, que o recebeu!

  Começou a ter visões de acontecimentos futuros, prever acidentes, chamamentos para orar e evitar!

  Demorou um certo tempo para aceitar isso e aprender como utilizar seus dons.

  Sentiu muito medo, a princípio, atingindo finalmente  a realização de seu desejo: o poder de cura em suas mãos, como tantos especiais espalhados pelo mundo e não sabemos!



A morte de Amelia - Dinah Ribeiro Amorim





A MORTE DE AMÉLIA!
Dinah Ribeiro de Amorim

  Era uma moça bonita, morena jambo, atraente e sedutora. Não percebia sua sensualidade, sua capacidade de atração.

  Namorava André desde a infância, desejando casar com ele, satisfazendo as famílias de ambos e a si própria. Se realizaria como mulher, esposa e mãe, não imaginando outro homem na sua vida.

  Noivos há dois anos, pretendiam marcar logo a data do casamento, assim que a situação de André melhorasse.

  Amélia não sabia que André, acostumado com ela, respeitava-a muito e, realmente, queria-a como esposa mas, traia-a de vez em quando, fora da cidade, para variar. Não lhe era fiel.

  Ivan, um amigo do casal, simpatizava muito com Amélia e costumava acompanhá-los em passeios e bailes. Na verdade, nutria por ela um amor oculto, sabendo que jamais teria alguma chance.

  Eis que André, sempre às escondidas, conhece Anita, uma linda moça de fora, visitando seus tios na cidade. Fica admirado e enternecido com os olhos azuis e cabelos louros da moça, diferente da sua Amélia. Resolve ter com ela um caso, levando-a para um motel longínquo, lugar meio escuso, só para namorados.

  Ivan, meio tristonho e angustiado, sozinho, resolve também sair e levar Rosa, uma amiga sua muito apaixonada, para o mesmo local, na intenção de se alegrar um pouco. Todos os jovens namoravam lá.

  Na saída, na hora do pagamento, encontram-se os dois: André e Ivan que, muito sem jeito o primeiro e, espantado o outro, ficam sem ação. Não sabem se conversam ou não. Pagam suas contas e vão embora. Cada um para seu lado.

  Na volta, Ivan pensa: “Chegou minha hora. Acabo com esse noivado e fico com Amélia.

  Na primeira oportunidade que teve, denunciou o outro para a noiva.

  Esta, desesperada, decepcionada, não acredita de imediato mas, inquirindo André  sobre suas saídas, percebe nele a mentira. Conhecia-o muito bem e sabia analisar até suas expressões.
  Desfaz o noivado e, triste, refugia-se em casa, com vergonha e dor.
  Ivan vai visitá-la e, sem muita habilidade, declara seu amor por ela.

  Amélia não sabe se o afugenta ou o consola, negando-se a aceitá-lo. Gostava dele como amigo mas nunca o imaginara como amante.

  O rapaz, ferido em seu orgulho, mais uma vez, sai, prometendo não mais procurá-la.

  Esta, aborrecida por ter perdido o noivo e o amigo, apanha um agasalho e sai também de casa, caminhando a esmo. Tem necessidade de andar para não pensar. Quando percebe, está na linha do trem, sem se importar se é perigoso ou não.

  Não houve o apito dele que está chegando e sim o barulho de um tiro, vindo do meio do mato e atingindo-a na cabeça. O trem consegue parar bem à frente da moça caída. Amélia é socorrida pelo maquinista mas morre antes de chegar ao hospital.

  A polícia é chamada. Não fora suicídio. Pelos antecedentes da moça, segundo o delegado Cunha, trata-se de um crime passional. Como descobrir o assassino seria um trabalho sério a desvendar. Dois suspeitos  principais são chamados: André e Ivan. Um, porque “ela” havia terminado o noivado, por motivos óbvios e, outro, porque havia sido rejeitado. Todos , na cidade, sabiam do seu amor oculto e foi a última pessoa a vê-la com vida.

  Trabalho difícil para o investigador Cunha. Que fora crime passional, já sabia mas, qual dos dois havia atirado em Amélia, levaria tempo para investigar. Verificar quem possuía arma, o tipo de tiro, entradas e saídas dos dois no horário do crime, qual deles ficara mais revoltado com a situação, mais incapaz de aceitar uma rejeição, coisas que toda polícia investiga no trabalho para a solução de um crime.

  Quem teria o maior motivo, levando à morte essa pobre moça, já tão arrasada com os últimos acontecimentos em sua vida.

  Estudando várias possibilidades, inquirindo prováveis testemunhas, examinando e investigando os dois suspeitos, Cunha foi descobrindo  desenrolando o fio da meada. Conseguiu chegar a Anita, satisfeita por ter continuado o namoro com André, após todo esse escândalo e, à Rosa, amiga íntima de Ivan, antiga e fiel apaixonada.

  Pronto, mais duas suspeitas prováveis do crime: Rosa, com inveja e raiva de Amélia, pela dor causada em Ivan, a quem amava desvairadamente e, Anita, a única que se dera bem com tal acontecimento.

  A arma do crime ainda não fora encontrada e os dois suspeitos principais possuíam fortes álibis para a hora do tiro. André estava fora da cidade, a serviço e, Ivan, fôra chorar sua mágoas na casa de um casal idoso, moradores de um sítio distante, uma espécie de padrinhos, que confiava muito.

  Restavam as duas moças. Aonde estavam na hora do crime.

  Anita, envolvida no escândalo, resolvera sair da cidade por uns tempos, voltando à casa dos pais.

  Rosa, após ouvir as lamúrias de Ivan, antes que ele viajasse para o sítio, compadece-se mito dele e, revoltada, tranca-se no quarto, por horas, segundo sua mãe.

  O investigador Cunha sabe que qualquer um deles poderia ter sido mas, seu instinto de policial se inclina mais por Rosa. A única a estar na cidade, trancada no quarto, com testemunho da mãe. Resolve investigar mais sua vida e descobre que havia um certo desequilíbrio em sua maneira de ser e viver. De todos, era a única que já havia tido porte de armas, abandonado várias vezes a casa dos pais e sempre terrívelmente apaixonada por pessoas que não correspondiam. Era muito infeliz!

  Resolve chamá-la algumas vezes e fazer-lhe mais perguntas.

  Aos poucos, percebe nela um ódio intenso à moça morta e uma enorme dedicação a Ivan.

  Poderia sim ter vingado a dor que ele estava passando.

  Sobre a arma que possuíra, não soube responder. Havia perdido por aí. Gaguejara bastante nessa hora.

  Tudo mudou quando a arma do crime foi encontrada, jogada num riacho, perto da linha do trem. Não possuía mais digitais mas era a mesma de onde partira o tiro. Rosa foi novamente chamada e descobriu-se o local em que comprara a sua. Eram iguais. Faltava a confissão. Pressionada, confessou tudo. Atirara sim na moça, como castigo, raiva, inveja, por ter sido tão amada e rejeitado seu único amor: Ivan. Era e foi solidária a ele a ponto de tomar ma decisão, o crime, mostrando seu desequilíbrio como tentativa de solução!