Rosto pintado
Patricia iasz
Não contive as lágrimas quando ví
aquele rosto pintado pela primeira vez. Delineado e colorido, muito me
despertou a atenção. Nele, via um sorriso largo, generoso, mas no fundo me
trouxe angustia e lágrimas. Tão disforme e estranho, expressando uma euforia
invasiva e, até, desrespeitosa para tão recém-encontro.
Circulou-me varias vezes com um fitar
penetrante. Estranha sensação de desconforto. Como rir com aquilo que mais
transmitia temor? Havia alguma inverdade naquelas pinturas. Somente eu sentia
dificuldade em desvendá-la. Olhando ao redor, dei por conta que muitos eram os
que se sentiam à vontade com esta presente face. Sorriam e se divertiam em
cooperação com suas expressões. Tudo bem à vontade. No entando, continuava eu
no triste aperto no peito, um soluço preso à garganta e enorme desejo de sair
correndo. Mas não poderia. Tantas regras
diziam que seria desrespeitoso dar costas ao que gentilmente queria alegrar.
Regras de sociedade.
Foram alguns longos minutos em sua
presença. Como demorava, ao meu ver, a careta em cores viváz. Um terror. Ao
sair do espetáculo circense, descobri uma memória ativa. Aquele Palhaço
Saltitante passou a pertencer aos meus sonhos. Não porque desejara, mas porque
sua presença medonha marcou-me profundamente.
Com o passar dos anos, compreendi que
Palhaços existem, saíram dos sonhos. Mas a maturidade me definiu como um ser
capaz de escolher não levá-lo para casa. Deixei-o livre nos circos. Lá, aprendi
que sorrisos podem ser devolvidos com respeito e diversão. E que no retorno ao
reduto particular de cada pessoa, uma consciência concreta de que palhaços não
residirão além dos sonhos. Ficarão lá em seus picadeiros alegrando a outros
enquanto a memória particular se reorganiza com outras experiências de vida.
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