Gregório, homem elegante como sempre fora, mantem aos seus 70
anos a energia e cordas vocais em alto e
bom tom.
Com sua voz de
barítono, ecoa por onde passa sons de
uma boa ópera, trechos decorados pela prática nos palcos do mundo.
Pela manhã costuma fazer
sua caminhada abrindo a porta de sua casa e a do seu coração. Canta em casa,
canta nos corredores, no elevador e nas ruas da cidade.
Naquela manhã dona
Julieta senhora da mesma idade resolveu implicar com o alto som que vinha do
apartamento vizinho. Havia mudado há pouco, veio de uma grande casa não estava acostumada e
nem gostava de ouvir sons altos, isto a perturbava.
Resolveu enfrentar o
dono daquela cantoria. Saiu na mesma hora em que ele abriu sua porta
e se encontraram no hall, e logo foi dizendo:
— Senhor, não estou
acostumada com sons altos. Há uma semana moro aqui e não aguento mais ouvir sua
voz. O senhor me perturba.
O homem gentil olhou
para ela e respondeu com a maior calma:
— Muito prazer, meu
nome é Gregório e terei enorme prazer em lhe oferecer uma xícara de chá com
algumas bolachinhas que trouxe da Europa.
A mulher o mediu de
cima a baixo examinando sua atitude e
respondeu-lhe que tudo bem, aceitaria, e
ainda pensou “Assim ao menos ele para de cantar”.
Ao entrar Julieta notou o bom gosto e a
qualidade dos móveis que decoravam aquele lugar, com as telas caras nas paredes e objetos do mundo
todo enfeitando os lindos móveis antigos. Enquanto esperava o anfitrião trazer
o prometido chá, encantou-se com a imensa biblioteca e a discoteca na sala ao
lado. Cogitou se não estaria sendo egoísta em julgar mal um homem aparentemente
tão fino.
Gregório voltou com
uma bandeja recheada de biscoitos e 2 xícaras para tomaram um chá inglês. Ele lhe contou que fora cantor
erudito desde muito jovem e que viajara pelo mundo cantando com orquestras
sinfônicas famosas, mas havia uns 5 anos resolvera se aposentar, somente
ensinando jovens artistas, não viajando tanto a trabalho e continuava exercitando
sua voz e harmonia.
Julieta envergonhada
pediu desculpas e confessou que quando jovem por proibição de seu pai não
seguiu carreira lírica, pois não ficava
bem uma jovem de família tradicional ser artista e muito menos viajar pelo
mundo. Talvez por este motivo tenha implicado com este homem tão gentil –
pensou.
Gregório então
mostrou-lhe vários DVDs com músicas, filmes e livros para que ela conhecesse
seu trabalho. Depois de algum tempo ele pediu licença para que fosse fazer sua
caminhada habitual, pois já estava
ficando tarde para isso, e a
convidou para que o acompanhasse, ela
aceitou e a partir daquele dia entendeu que deveria respeitar e entender as
diferenças entre as pessoas.
Percebeu ainda que a
antipatia não leva a nada e que não fora por acaso que estava morando naquele
lugar. Ganhara um grande amigo, sua simpatia e ainda podia ouvir, ler e
assistir a filmes na companhia de uma pessoa tão simples e tão culta.
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