SABEDORIA
MATERNA!
Dinah Ribeiro de Amorim
Manhã ensolarada e quente no solar dos
Vieira Couto.
A
luz, penetrando em raios exprimidos pelas frestas das cortinas, refletia-se nos
móveis e chão daquela sala de armários, sofás e mesas entalhadas com arabescos
suaves e artísticos. Demonstravam o poderio e a abundância dos senhores do
lugar. Uma grande extensão de terras, circundadas por montanhas, escondendo
grande plantação de cana, riqueza econômica daquela região do nordeste brasileiro.
Época ainda do Brasil-colonia, quando os senhores de engenho dominavam,
determinando as regras de como viver nas pequenas cidades que nasciam. Eram os
donos das famílias, dos empregados, dos inúmeros escravos que possuíam, das
autoridades exercidas no país em formação.
Jogado num canto escuro da sala, em meio a um canapé estofado de veludo
verde com acabamentos dourados, denunciando sua origem francesa, estava
Rodolfo, o filho mais jovem do coronel Jacinto, o rico fazendeiro local, senhor
daquela região, semi adormecido, aparentando cansaço e palidez de uma noite mal
dormida.
Andava ultimamente insone, distraído, vagando à noite pela casa, como se
pensamentos confusos atrapalhassem sua mente sempre tão sóbria e alegre por
natureza.
Era
diferente dos outros filhos, enérgicos e severos como o pai.
Ao contrário,
saíra à mãe, mais dócil, amoroso, sentimental e apaixonado, tratando com
delicadeza e bondade os escravos sofridos da senzala.
Assim, semi adormecido, todo vestido como no dia anterior, encontra-o
sua mãe, a senhora Rosário, primeira a se levantar. Não esperara seu café ser
servido no quarto pela mucama e levantara logo cedo, preocupada com aquele
filho mais moço, pressentindo que não andava muito bem.
Dirige-se logo a ele, chamando Rodolfo delicadamente, afastando
levemente as pesadas cortinas azuis.
Assustado, o moço abre os olhos e encontra sua mãe inclinada sobre ele,
com olhar amistoso e inquiridor.
“Que
fazia na sala até aquela hora que não fora para seu quarto.
Com certeza não
andava bem de saúde,” pensa ela. Fazia dias que o observava e seu instinto
materno lhe dizia que algo estranho estava acontecendo.
Rodolfo sente na mãe compaixão e bondade. Resolve abrir-lhe o coração.
Andava apaixonado por uma escrava nova que chegara à fazenda. Morena clara,
bonita, de olhos pretos enormes, corpo esguio, forte para o trabalho e para a
vida. Deveria ter mãe escrava e pai branco, sua pele denunciava sua origem, não totalmente negra,
o que a fazia diferente das outras. Compadecera-se dela, seu olhar triste e
calmo, sua aceitação da realidade, vendida que fora por um amigo de seu pai e
recomendada como ótima escrava para serviços domésticos. Sr. Jacinto também se
encantara com a moça, Joana era seu nome pois fora batizada e, fazia questão de
usar seus préstimos como escrava pessoal, costume normal na época, quando os
donos de escravos se serviam das mulheres que quisessem, além das esposas. Isso
estava acabando com a vida do filho, que não sabia como agir diante dessa
situação. Amando uma escrava, coisa não muito normal dentro dos costumes da
casa e, ainda amante do próprio pai, a quem temia e respeitava como todos.
Dona Rosário, com a sabedoria e entendimento de quem já vivera muito,
certa de que tudo passaria com o tempo, incentiva-o a viajar, sair daquele
ambiente que o machucava tanto, conhecer Paris, cidade que tanto sonhara e não tivera ainda oportunidade de ir.
Dedicar-se à arte, desenho, pintura, conhecer pessoas famosas, seus ídolos,
pois adorava pintar.
Com
certeza, em meio às alegrias oferecidas pela cidade luz, Rodolfo se apaixonaria
por outra moça e esqueceria Joana, a escrava do pai e sua triste situação.
O
filho aceitou a orientação da mãe e preparou sua partida, muito angustiado,
achando que simplesmente iria mudar o cenário mas o problema persistiria.
Eis
que se passam dois anos e Rodolfo resolve voltar, saudoso da família, dos seus,
daquela região. Volta casado, feliz, com Francine, uma loura chique e moderna,
grávida de seis meses, encantada por conhecer o Brasil e as terras tão faladas
por ele. De Joana, a escrava de seu pai, não se lembrava mais.
“
Infelizmente, existem coisas na vida que não conseguimos resolver de pronto e
uma saída estratégica se faz necessária até que o problema se solucione com o tempo”,
pensa, feliz, Da. Rosário...
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