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terça-feira, 11 de setembro de 2012

DESCONFIANÇA - Cida Bianchini


     

                       
DESCONFIANÇA
Cida Bianchini

Mais um passo e pára. Esconde-se atrás do tronco da arvore, para não ser visto. À frente, Ligia segue em passos largos.  De repente, entra numa relojoaria. Não tem pressa, parece ser exigente na escolha da jóia.   Abre o guarda chuva ao ganhar a rua molhada e lamacenta. Segura com firmeza a bolsa devidamente protegida ao peito e dirige-se à  avenida  de grande movimento. O cuidado de Fernando agora é redobrado. Não pode perde-la de vista. Tenta controlar a ansiedade, mas é fraco, coitado. A desconfiança esmaga-lhe o coração. Pra quem seria aquela jóia    ostentando a grife no pacote? Segredos da alma. Abatido, entrega-se  aos funerais do amor. O doentio ciúme leva-o a loucura. Não aceita  traição. Delira, enlouquece, enquanto acompanha os passos da amada sem perde-la de vista.

Dói-lhe a alma ao vê-la entrar num badalado restaurante. Acompanha atentamente seus gestos ao sentar-se à mesa e sofre as demoras do tempo de espera.  Escondido atrás do pilar, mão direita no bolso, segura o revolver nervosamente pronto para ser sacado a qualquer instante.

Quem será o infeliz, pensa endoidecido a cada homem que se aproxima. A demora é grande. Enfim alguém se dirige à  mesa. Elegante, cabelos grisalhos, bom gosto no vestir-se, tão bela quanto a filha. Abraçam-se demoradamente. Beija o pacote  que acaba de ganhar: presente de aniversário, diz Ligia com voz terna.

Ufa! Respira aliviado o jovem apaixonado, enquanto procura uma lixeira para  jogar sem medo o revolver, juntamente com sua imbecilidade. Volta pra casa despojado da dúvida que o  fez sofrer tanto.

Está feliz. Vê beleza em tudo que o cerca. Na chuva que cai sem parar, na incômoda rua apinhada de gente, no cinzento céu que parece anoitecer o dia, enquanto sua alma celebra o amanhecer ensolarado do amor.

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