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sábado, 11 de agosto de 2012

APRENDI COM MEU PAI - Carmen Lucia Raso

Homenagem aos pais que ensinam os filhos a serem pessoas dignas. Que ensinam a respeitar e a valorizar a familia, e a amar seus pais.




APRENDI COM MEU PAI
Carmen Lucia Raso

Era pequenina e já observava a força e a dignidade daquele homem.

Em noites de febre alta, lá vinha ele com o termômetro, remédio e álcool pelo rosto e corpo.

Frequentemente pincelava nossa garganta, dava ´”salamargo” –“Para purificar o sangue.” Dizia ele.

Muitas vezes ficava com um ou mais de seus sete filhos  a noite toda, cuidando, espreitando e esperando a melhora de cada um deles e o  horário de se levantar era quando passarinho acordava.

Caligrafia,  aprendi com ele. Cada um dos filhos tinha seu caderno, borracha e toquinho de lápis com ponteira que sobravam do escritório.

Não era  “pão durice” não, mas a lição de que tínhamos de economizar e não esbanjar.

Aprendi com ele o asseio de nosso corpo, nossa cama, nossa casa.

Aprendi também que o animalzinho, passarinho ou cachorro tinham de ser cuidados, alimentados e limpos como nós.

Aquele homem já quase calvo era meu ídolo e ao mesmo tempo meu inimigo, pois não admitia mentira, nem fraqueza. Não beijava nem dava colo, mas cuidava.

Adolescente, conheci um homem ciumento e cuidadoso em excesso. Nessa hora se tornava meu inimigo.

As vezes eu notava nele um homem de olhar distante e uma respiração ofegante e quando parava em frente a janela do apartamento em que morávamos, era tão alto que se podia tocar o céu e eu sabia, eu pressentia que ele estava preocupado e nervoso. Talvez neste momento estivesse conversando com Deus, com os anjos ou consigo mesmo e não ouvia mais ninguém, só o céu.

Aprendi com este homem que é melhor saber fazer as coisas como cozinhar, passar, trocar lâmpada, concertar tomada, ler e estudar, pois quando não se pode chamar e pagar alguém  para fazê-lo, isto fica por nossa conta. Dizia: - “O saber não ocupa lugar!” Sobrevivência?! Não sei, mas este aprendizado ficou impregnado em mim.

Com meu pai aprendi a crescer, pagar minhas contas, cuidar de mim, da minha família, dos meus amigos e das minhas coisas. Com ele aprendi também que um homem não se mede por sua aparência nem pelo que ele tem de coisas materiais, mas por aquilo que carrega dentro de si.

E agora, que não o tenho mais comigo olho para o céu e converso com ele, com Deus e com os anjos e conto que tenho saudades do homem mais bravo, mais carinhoso e o melhor que já conheci em toda a minha vida.


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Este texto foi criado em nossa Oficina de Textos, baseado em temas aleatórios ofericidos para os participantes.

CARMEN LUCIA RASO - ICAL   /   Agosto de 2012.

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