Ver e não Crer
Hirtis Lazarin
A família de Juliana teve que deixar a casa no bairro Paraíso, onde moravam desde o nascimento da menina. O aluguel estava caro demais por conta da especulação imobiliária que atingiu todo o país. Conseguiram uma casa num valor acessível e se transferiram para o Jabaquara.
Juliana foi a que mais sentiu a mudança: deixou a casa onde crescera, a escola, a turma e o namorado. Mas o que fazer? Circunstâncias da vida.
No começo sentia-se um peixe fora d'água no colégio novo, pois é sabido que os adolescentes costumam hostilizar gente nova no pedaço. Mas seu jeitinho simples, atencioso e comunicativo facilitou-lhe a vida.
Aos poucos foi se ajustando e ganhando simpatia. Não foi tão difícil achegar-se a duas garotas da sua classe, Chris e Letícia, tão diferentes no estilo e tão companheiras em tudo; não se largavam por nada, era até bonito de se ver.
Chris é estilosa, antenada na moda, unhas compridas e sempre pintadas, cabelo loiro mexado; Letícia, por sua vez, descolada e displicente, não aposenta as calcas de moleton, largas e confortáveis e o tênis já gasto, mas inseparável. Adora jogar futebol com os meninos e é craque na defesa, não deixa bola nenhuma passar.
As três se juntaram na amizade, nas confidências e nos segredinhos.
Era segunda-feira e Juliana chegou à escola amuada, ausente, olhos fundos de quem não dormiu nada e chorou muito.
Confidenciou às amigas que não sabia o que estava acontecendo com seu namorado Pedro. Durante toda semana ele não atendeu suas ligações, deixara vários recados na caixa postal e nenhum foi retornado, mandara emails e nada; no sábado, sem avisá-lo, foi até sua casa. Tinha certeza que ele estava lá e não quis nem vê-la.
A semana toda foi assim e Juliana definhava na sua tristeza, era a imagem da Madona chorando a ausência do Menino Jesus arrancado de seus braços.
Chris e Letícia eram garotas de atitude e iam correr atrás do prejuízo. Mexeram e remexeram na mochila de Juliana e encontraram o que queriam: o endereço de Pedro.
No sábado seguinte, de manhã, estavam as duas em frente ao número 442, na rua Aymorés, endereço do tal Pedro. O rapaz ainda estava dormindo, foi pego de surpresa e não teve tempo pra fugir.
Na cara dura, foi chamado de covarde e moleque; Juliana merecia ao menos uma explicação pelo seu afastamento, uma menina de ouro não merecia passar por aquela humilhação.
Pedro ouviu calado gatos e bugalhos, ouviu o que queria e o que não queria; não ousou nem esboçou qualquer reação, porque viu que as duas garotas eram fogo.
Quando deixaram o rapaz abrir a boca, ele contou que estivera duas vezes nos portões do colégio pra fazer surpresa a Juliana e, nas duas vezes, viu sua namorada acompanhada de um rapaz alto, forte, boa pinta; pareciam tão íntimos, felizes, rindo com facilidade. Sentiu-se traído e louco de ciúmes. Decidiu afastar-se dela, apesar do amor intenso que o queimava por dentro. Estava fazendo de tudo para esquecê-la.
À medida que Pedro ia contando, Letícia e Chris se entreolhavam com ar malandro, riso apertado entre os lábios que, num dado momento, explodiu numa gargalhada debochada.
__O garoto é nosso amigo. E jamais haveria qualquer interesse entre eles, além de uma amizade verdadeira. O Paolo é gay assumido e aceito numa boa pelo grupo.
Pedro morreu de vergonha. Não queria nem podia acreditar na tolice que fizera. E o arrrpendimento, então? O quanto era infantil...
Como dizem os mais velhos, "há males que vem pro bem" e são as lições da vida que nos trazem amadurecimento.
Os três tomaram o primeiro ônibus, Pedro desceu perto da casa de Juliana.
Não havia tempo a perder...Mil perdões, mil provas de amor, se necessário fosse...
Juliana era a sua princesa, uma jóia valiosa e ele sabia como era difícil viver sem ela.
(Texto criado a partir da leitura de duas gravuras)
Criação: Hirtis
Nenhum comentário:
Postar um comentário