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sexta-feira, 20 de maio de 2011

Não quer vir jantar comigo? - Suzana Lima

No restaurante você está esperando pelo marido ha mais de duas horas, e um homem solitário em uma das mesas deseja jantar com você. Você olharia para trás e o convidaria para sentar-se com você? -  Resposta: sim





Ela começou a ficar furiosa com tal situação. Ali, linda, cheirosa, toda mulher, a esperar um marido relapso e pouco cavalheiro, que não chegava. Um marido que sequer lhe dera alguma justificativa para não estar no encontro na hora marcada. Pior, para nem comparecer. E seu celular estivera ligado aquelas três horas infindáveis. Seu admirador, às suas costas, tinha toda razão. Ela era mulher que fazia os homens esperarem por ela, não era feita para esperar ninguém.

Olhou o relógio outra vez: 10 e 15. Decidiu-se; virou-se devagar, bem sedutora, cruzando as pernas com graça e jogando os cabelos para o lado e acenou para o homem que esperava quieto, sentado bem atrás dela..

- Não quer vir jantar comigo? – perguntou com sua voz mais doce.

Ele prontamente se levantou, aproximou-se dela sorrindo, pediu licença e se sentou. Era belo, muito belo. E viril. Qualquer coisa no seu modo de sorrir, apertando um pouco os olhos, seu à vontade e segurança, sua elegância num terno muito bem cortado, tudo isso compunham um retrato muito sedutor de um homem.

- Quer pedir o jantar agora? Perguntou estendendo o cardápio para ela.

Ela não estava com vontade de comer nada. Ainda bem que o aborrecimento causado pelo marido estava se esvaindo diante da excitação causada por sua atitude tão ousada, desafiadora mesmo, aceitando jantar com um completo desconhecido. Assim, como pensar em comida nesta hora, com aquele homem à sua frente? Quem era? O que fazia? E, mais importante, até onde ela iria com ele?

Olhou o cardápio devagar, sentindo o leve aroma cítrico de uma lavanda fina, notando suas mãos bem feitas brincando com a taça de vinho, a falta de pressa, a espera silenciosa como um tigre à espreita. Quieto, mas atento.

- Na verdade, perdi a fome, sabe?

- É natural. Mas já passou das dez e você não pode ficar tanto tempo sem se alimentar. Pedimos o couvert que é uma delícia e mais uma taça deste espumante. Até lá você resolve o que fazer. Está bem assim? Você está linda demais para sair deste restaurante sem ao menos ter provado o patê de berinjela e as torradinhas de alho do mestre Cortez. São divinos e ele ia ficar muito contrariado se soubesse que nem sequer isso lhe serviram.

- Você vem muito aqui? perguntou admirada com desenvoltura dele num restaurante tão chique. Até o nome do chef ele sabia...

- Pelo menos uma vez por semana. Mas conheço o chefe há muitos anos. Somos conterrâneos, da velha Andaluzia. – fez sinal para o garçon e encomendou o couvert .

- Você é espanhol então? Não percebi pelo seu jeito de falar.

- Sou. Mas vim para o Brasil quando tinha dezoito anos. Será que já perdi o sotaque? - Desta vez ele falou carregando bem no espanhol, sabia que isso sempre provocava algum frissom.

- Agora sim. Que facilidade falar com ou sem sotaque... observou ela., se arrepiando toda.

- Como você acha que fica melhor? Ele continuava carregando nas palavras e aproximou seu rosto um pouco do dela, sorrindo, meio divertido.

- Acho que você sabe bem o efeito que um sotaque produz, não é? ela resolveu jogar um pouco de charme para ele e falou sua frase com o restinho do sotaque francês de que se lembrava.

- Ulá, lá, lá – disse ele meio surpreso - Chega a ser uma covardia falar tão lindamente com este sotaque francês, ainda mais partindo de uma mulher tão bela.

Naquele momento o garçon veio colocar o couvert na mesa que era bem mais que patê e torradinhas. Parecia um banquete. Encheu as taças e se retirou bem discretamente. Quase na mesma hora os músicos começaram a tocar canções românticas. Ele ergueu uma taça para ela:

- À nossa amizade e que não termine aqui.

- Ao espanhol misterioso que salvou meu jantar. – disse ela faceira tocando sua taça na dele.

Ele olhou-a intensamente, enquanto bebia um gole de seu espumante. Depois preparou uma torradinha com o patê de berinjela, levando-a até a ela.

- Veja se não é um patê especial.

Ela aceitou a torradinha graciosamente. E vendo sua boca assim tão de perto, ele não se conteve e acariciou seu rosto devagar, depois a boca e aos poucos foi aproximando seus lábios dos dela. Ficaram assim algum tempo, olhando-se fascinados diante da onda irresistível de atração que percorreu seus corpos.

O couvert ficou para trás, as taças ainda cheias também e eles saíram tão enlevados da mesa que ela nem percebeu direito que ele a levava para o elevador, pois o restaurante ficava num hotel. Mas no segundo que a porta se fechou, ela conseguiu perceber Fábio entrando no restaurante à sua procura.

- Foi um momento mágico em minha vida. Parecia um filme de suspense. Por um segundo Fábio não me viu ali dentro do elevador, abraçada com outro homem. – contou ela depois às amigas. Mas enquanto a porta se fechava, deu bem para vê-lo ali desnorteado, me procurando nas mesas, enquanto eu subia para o quarto de um homem até então completamente desconhecido para fazer amor. Isso deu um sabor extraordinário à noite. – Gente, e que noite! O espanhol, aliás, Pablo, é uma figura, grande amante, grande cavalheiro, valeu cada minuto que passei com ele.

- E aí? Seu marido não quis explicações? Não ficou furioso?- perguntaram elas.

- Não dei explicação nenhuma, tive uma noite de amor espetacular com o espanhol, depois fui à casa de minha irmã. Para todos os efeitos dormi lá, furiosa pelo desencontro dele. Pelo menos foi o que eu ouvi minha irmã explicar a ele pelo telefone.

Olhem, - ela sorriu luminosa - nunca fui tão bajulada como agora. Ele faz tudo para me agradar. Diz que jamais vai querer ver aquele brilho sanguinário nos meus olhos...

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