BLOG NOVO: CONTOS DO ICAL


terça-feira, 30 de março de 2010

CONTO NORDESTINO - MJPSousa



CONTO NORDESTINO
MPJSouza

Era uma vez um sítio no aconchego das Alagoas.
O pássaro elevou-se em languidos círculos na corrente de ar quente. Sua sombra deslizando sob o sol da tarde, ao longo das paredes incandescente dos morros. De vez em quando imitava um chamado, e o som ecoava como um lamento. Um homem e dois meninos avançavam com dificuldade pela trilha que serpenteava o lado do leito seco de um riacho. Seguiam de cabeça baixa, os rostos untados de suor e poeira. O caminho era escarpado e avançavam de forma lenta e penosa com sacos nas costas. Assemelhando-se a peregrinos que haviam perdido tanto a rota como a fé; ou pobres refugiados de uma atrocidade distante, despidos de tudo, menos da tristeza e autopiedade.

Joaquim voltava da vila com os filhos, trazendo comida parca para seu sustento. A mulher ficou no rancho esperando por eles.

Agripina era nervosa, vez por outra ficava internada na casa de misericórdia lá na vila. Era a segunda mulher de Joaquim. A primeira morreu logo depois do nascimento do Solidônio, o segundo filho. Ela o teve ali no rancho sem higiene, cuidados, com uma preta velha que dizia ser parteira. Era uma santa mulher, mas Agripina uma louca, que batia nos meninos e não permitia que Joaquim se interferisse, senão apanhava também. Era magra como uma taquara. Joaquim falava para os filhos terem paciência que tudo se arranjaria no final. Enquanto isso os dias e anos passavam.

Numa tarde, enquanto as brasas de uma fogueira brilhavam num circulo de pedras sujas de cinza, apareceu por lá um matuto bem apanhado, de fala mansa, tocador de viola, com voz altaneira e quando ria aparecia o dente de ouro. Agripina começou arrastar asa para o matuto cantador. Limpava melhor o rancho, estava mais sorridente e procurava incrementar, na medida do possível a bóia. Joaquim e os filhos viam tudo, mas ficavam na deles.

O matuto de dente de ouro já estava no rancho há uma semana. Ajudava Joaquim e as crianças com a plantação e uma vaca que lhes dava o leite, mas o que gostava mesmo era de cantar. Uma bela manhã de sol enchendo o ar de uma luz dourada na qual, cada detalhe era claro e nada era ofuscante e os rostos pálidos e magros se levantando para começar o dia. Joaquim se levantou, passou uma água no rosto e chamou pela mulher. Foi até o curral, não a encontrou. Em cima da mesa da cozinha, numa folha de papel encardido e amarfanhado estava escrito: Adeus Joaquim, vou viver a vida. Os meninos rodeando o pai queriam saber o que estava escrito! Agripina nos deixou. Um olhou para o outro e se abraçando disseram: Que sejam felizes para sempre.


Nenhum comentário: