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segunda-feira, 6 de junho de 2011

Em busca da" PAZ" - Hirtis Lazarin



Em busca da" PAZ"

     O Mestre José Amaro, preso àquele tamborete, batendo selas num movimento único, produzia um som articulado e tão monótono quanto era sua vida.  Até dormindo a toada do martelo não o abandonava.  Pudera, desde pequeno aprendera o ofício com o pai e nunca mais o largara.



      Desanimado, voltava pra casa depois de mais um dia de labuta e já sabia o que  o esperava: uma mulher que o aturava e uma filha bem esquisita.
     Ia cabisbaixo, solitário...  Pôs-se a pensar; engulo todos os dias mediocridade, vaidades, hipocrisias, pessoinhas fúteis e vãs e é agora, ao final da tarde, que tento vomitar todas essas coisas ruins.
     Sentiu um vazio na alma.  Era melancolia.  Estava no escuro, mesmo sendo ainda de dia.
     Mas eis que sem mais nem porquê sentiu um DESEJO: sair daquela estrada e caminhar sem rumo nem direção.
     È o desejo que move o mundo, é a arma da conquista; é o desejo que sugere mudanças, dilacera o medo, desfaz amarras, desprende raízes fincadas na terra, passa por cima da cautela e do pessimismo.  Se há DESEJO há ESPERANÇA.
     Será que Amaro despertara do pesadelo que era sua vida?  Dizem que é na pausa, no silêncio que nascem pensamentos fantásticos, decisões importantes, tentativas de soluções...
     O seleiro não percebera quanto tempo já se passara, mas a noite chegou esfusiante, transbordando alegria.  Pintou no céu azul uma lua crescente e estrelas mil que cochichavam um cochicho harmonioso.  Amaro, imerso no seu silêncio, ouviu-as e pôs-se a assobiar cauteloso para não errar o compasso e a melodia.
     O nosso homem caminhou longe, perdido entre árvores altas e baixas.  Sentia o vento macio alisar a pele áspera do rosto maltratado e que  desarranjava sua cabeleira farta.  Estava feliz.
     Sem selas, montou nos flancos do corcel branco e galopou livre, sem rédeas nem amarras.  As patas do cavalo troteavam tão ligeiro que, arrancavam galhos, espantavam sabiás, sapateavam no lodo, escalavam montanhas. 
      Para Amaro era a sensação suprema da liberdade que acalma nossa alma, que nos leva ao sonho da loucura sem enlouquecer, ao sonho da fantasia sem se fantasiar, ao sonho do amor antes de se entregar.
     Em tão pouco tempo o seleiro descobriu que a vida não é poupança que quanto mais se guarda mais se tem.  A vida é pra ser gasta;  quanto mais se vive, mais vida se tem.
    A noite passou voando como águia em direção a sua presa.  O sol brilhava forte e poderoso.  Sinhá acordou e notou a ausência do marido.  Dormiu profundo e nem se deu conta.
     Percorreu todos os aposentos da casa e encontrou-o na cadeira de balanço no alpendre.  Rosto sereno, leve sorriso, semblante de paz.
     E a paz tem sabor de água, sabor de nada, é indefinível.  A paz refresca, hidrara, saceia.  Não traz úlceras como o café e a paixão, nem provoca ressaca como o ódio e o vinho.  Paz é quando o coração bate e a gente nem nota.
     O coração do seleiro José Amaro, a gente notava, que no balanço adormecera em paz,  para sempre.

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