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sábado, 24 de maio de 2014

O ANJO QUE NÃO QUIS CRESCER - Cida Bianchini



O ANJO QUE NÃO QUIS CRESCER                                               
Cida Bianchini

Hoje, ao ouvir a musica de Ataulfo Alves num incontido saudosismo correndo atrás do passado, sentindo-se criança de novo, resolvi entrar no choro do poeta.

 Sai voando, em busca da menina debruçada na janela, laço de fita engomado na cabeça, e trança caída suavemente nos ombros. Bati e rapidamente a porta do tempo se abriu...

Que surpresa! Deparo-me com um anjo. - Que susto!   Quem é você?  Pergunto meio sem entender...

- A quem procuras? -  indaga-me com certa ironia.

 -Eu? Eu me procuro... Revisito-me para contemplar a menina que fui, suas travessuras, numa ingenuidade misturada com audácia, temperada com sal da sabedoria, às vezes disfarçada da simplicidade de quem procura descobrir o mundo, já descoberto há tempo...

-Pois é,  eu sou você... Talvez estranha-me porque faltam-me as tranças! O tempo passou, e elas caíram de moda. Sabia que Anjo também se moderniza?

-Eu? Eu, não era tão bela assim! Vivia de cara suja correndo atrás da bicharada, pulando com força na pinguela, fazendo-a tremer qual gangorra... Eu não tinha cara de anjo. Minha avó dizia que eu era linda como um anjo e que eles são luzes suaves que descem do céu para iluminar o nosso coração. Minha avó nunca mentiu... Mas, acho que era o reflexo dos meus encantamentos em oferecer-lhe tanto carinho... Ensinou-me também a criar um anjo dentro de mim... Lembro-me que exagerei no tamanho das suas asas, elas eram tão grandes... E você não tem asas! Logo, não é o anjo que desenhei naquela manhã cheirando a jasmim!

- É verdade!  Você me fez com asas enormes, porém esqueceu-se de me dar espaço. Prendeu-me num coração tão pequeno, e já que não tinha espaço para voar, resolvi cortá-las... Chorei algumas vezes por não poder acompanhar-te!  Não cresci, continuei criança, encantada em olhar as borboletas voarem, os passarinhos cantarem, a chuva cair, o sol brilhar. Em meu mundo não há violência, nem morte, nem odor de prepotência, sinto perfume de flores, até as folhas do outono rolam no chão em harmonia, em rimas de poesia...Foi muito bom eu ter ficado aqui...

Gostaria de abraçar-te, anjo bom, mas tenho medo... Posso contaminar-te... O meu mundo tem espaço demais, é perverso, impuro, é ainda rascunho cheio de rabiscos e imperfeições, acho até que nunca chegará à beleza, à pureza do teu mundo infantil...

Toma leve minhas asas, busque o infinito, conheça as galáxias, a lua vigiando a terra, o verde da serra, o dia amanhecendo, o sol aquecendo, o planeta te espera cheinho de amor. Tira da alma a tristeza, deixa as nuvens te envolverem de beleza, e, sinta a presença de Deus!      

   

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