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quarta-feira, 26 de fevereiro de 2014

DESCULPE, FOI ENGANO - Patricia Iasz



DESCULPE, FOI ENGANO.
Patricia Iasz

        Era manhã, lá estava ela no corriqueiro do dia. Acabara de recolher a mesa do café da manhã e degustava uma doce tranquilidade matinal após o dever cumprido. É que o marido já havia saído para o trabalho e as crianças ido à aula.

        Estava na ponta da escada, prestes a subir os degraus, quando o telefone toca repentinamente. Estranhou o ruído sonoro por lhe causar um súbito calafrio na barriga. Virou-se então apressadamente e foi buscar o aparelho que descansava numa mesinha ao lado do sofá da sala.

        Assim que balbuciara o primeiro alô, escutou uma voz nervosa e afoita que dizia:

-Senhora! Senhora! Por favor, Senhora!

        Aquelas palavras lhe penetraram como espinho a alma e logo percebera que estrava com pernas trêmulas mãos suando frio, coração acelerado e uma desconfortável sensação de nó na garganta que a dificultava em responder ao chamado. Enquanto o silêncio emudecia os lábios, o ouvido atento parecia lhe esgarçar a capacidade auditiva. Cada vez mais, aquela voz lhe rasgava o íntimo.
– Senhora! Senhora! Você ainda está aí? Preciso comunicar algo que acabo de ver acontecer. A criança não teve culpa, o carro é que invadiu a calçada. Eu vi quando ela, coitadinha, foi lançada ao alto e o celular que segurava... Aff... Foi lançado longe.

        Ao findar deste comunicado, deu-se por conta do poder que há nas palavras! Elas acabaram de disparar as lembranças recentes do tão agradável café matinal. A imagem das crianças sorrindo, se divertindo com as brincadeiras do pai,  começavam a martelar freneticamente na memória. Em seguida, como fleches de luz, a dúvida vinha como avalanche no pensamento. Quais dos 2 filhos deveriam ser? E nada da voz, ainda presa à garganta, conseguir se expressar.  Somente o som vindo do outro lado da linha era incessante, o que aumentava ainda mais a aflição do momento. O incógnito individuo continuava – Estou com o celular da criança, vi que não estava quebrado e liguei para o primeiro numero que apareceu no visor. Você a conhece? Responda-me, por favor!

Triste instante! É que mal terminara o soar dos dizeres e a ligação interrompera. Agora, somente a oculta presença do vago se instalara ao telefone. Quanta angustia há nisso! Os olhos já ardendo, começaram a lacrimejar e, percebendo que os pés fraquejavam prestes a deixá-la cair no chão, sentou no sofá. Queria levantar, correr pela casa, pegar as chaves do carro, sair rápido para rua, mas algo a impedia dos gestos. Só conseguia permanecer atônita com a recente novidade que acabara de receber.

Minutos depois, novamente o  telefone toca. E mesmo querendo evitar  atendê-lo, vestiu-se de coragem e  conseguiu sussurrar um tímido alô. A voz do outro lado da linha parecia ser outra e soava de maneira mais suave e calma.

– Por favor, Senhora. Gostaria de pedir mil desculpas. É que foi um engano. O celular do qual liguei não pertencia à criança do acidente e sim a uma coleguinha que estava dentro do colégio. A mãe da criança acidentada já está no local e por incrível que pareça, a criança teve somente algumas escoriações, além do grande susto e já está sendo atendida pela ambulância.

Ao ouvir tal recado, a única resposta capaz de ser dita foi – Tudo bem! E desligou o telefone.

Agora, ainda sentada no sofá e aliviada por ter o corpo dado um enorme suspiro, lembrou-se de ligar para o celular da filha a fim de conversar  sobre o ocorrido. Porém, no fundo mesmo, nada mais seria gratificante do que escutar uma voz conhecida que lhe diria:

 - Oi mamãe!


        

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